Quem vê as aves domésticas como animais estúpidos se engana. Estudo compara inteligência de galináceos à de primatas, apontando que galinhas são capazes de empatia, lógica e até um pouco de astúcia.
Galinhas e galos são incrivelmente inteligentes e entendem muito do que acontece no mundo à sua volta. Essa é a conclusão de uma recente revisão de literatura científica sobre a espécie, na qual se baseou um relatório da organização americana de proteção dos animais Farm Sanctuary.
Sua iniciativa The Someone Project (O Projeto Alguém) visa gerar empatia pelos animais de fazenda, que há dezenas de milhares de anos vivem lado a lado com os seres humanos. No caso específico, trata-se também de um apelo contra o método de criação em bateria.
As cientistas comportamentais Lori Marino e Christina M. Colvin analisaram numerosas publicações para compilar um metaestudo sobre os galináceos. Segundo este, as capacidades cognitivas e emocionais das aves lhes permitiriam perceber tanto quanto crianças pequenas, primatas ou certos pássaros geralmente considerados muito mais inteligentes.
"A noção de psicologia galinácea, em si, é estranha para a maioria das pessoas", reconhece Marino, em artigo publicado na revista científica Animal Cognition. No entanto, a espécie é capaz de tirar conclusões lógicas a que crianças só chegam aos sete anos de idade. Portanto "galinhas são tão complexas cognitiva, emocional e socialmente como a maioria das outras aves e mamíferos, em muitas áreas".
Se uma lufada de vento agita as penas de seus pintinhos, as galinhas mães passam a desenvolver os mesmos sintomas de estresse que os filhotes
Da aritmética à multitarefa
Segundo a ex-acadêmica Marino, que atualmente dirige um centro de defesa dos direitos dos animais, galos e galinhas são "comportamentalmente sofisticados", "possuem algumas aptidões aritméticas muito básicas" e "têm personalidades distintas". Enfim, as propriedades de seu cérebro, do tamanho de uma noz, vão muito além do que se esperava.
Um dos estudos examinados pela dupla de pesquisadoras deduz que até mesmo pintos sabem contar. Um teste com ovos de plástico amarelos mostrou que, no mínimo, os filhotes recém-chocados percebem a diferença entre um conjunto de objetos maior e um menor.
As galinhas também parecem dotadas de uma capacidade abrangente de pensar tridimensionalmente e, até certo ponto, de multitarefas. Elas conseguem procurar comida ao mesmo tempo em que avaliam quão amigável ou hostil um outro animal é, enquanto simultaneamente vasculham o céu para se proteger de eventuais aves de rapina.
Ao que tudo indica, seu órgão sensorial mais importante é o bico, com uma capacidade fenomenal de reagir ao paladar, olfato e tato. Qualquer dano a ele envolve grande sensação de dor.
Empatia e astúcia
Um considerável grau de autocontrole é igualmente característico das galinhas: elas podem se privar de se alimentar imediatamente se sabem que receberão ração melhor mais tarde.
Além disso, as aves são conscientes do próprio status social dentro de uma determinada população, tendo clara sua posição na hierarquia. Basicamente, elas conseguem refletir sobre o próprio ser.
A comunicação dentro da espécie é igualmente bastante complexa, envolvendo 24 sons diferentes e um grande número de sinais visuais. Galinhas percebem intervalos de tempo e fazem deduções sobre acontecimentos no futuro. Elas se observam mutuamente e aprendem umas com as outras, além de serem fortemente influenciadas pelo comportamento materno.
Sentir ansiedade pelos outros também faz parte do universo psicológico galináceo. Se uma lufada de vento agita as penas de seus pintinhos, as galinhas mães passam a desenvolver os mesmos sintomas de estresse que os filhotes.
Isso leva à dedução de que elas seriam capazes de empatia, a capacidade de entender as eventuais aflições de outros membros da espécie. Tal nível de compreensão só tem sido registrado em relativamente poucos animais, como primatas e corvos.
Espantosa é também a capacidade de engano e subterfúgio. Durante o ritual de corte, por exemplo, galos de status mais baixo tentam atrair as fêmeas com ofertas de comida, como é usual, mas sem os chamados que normalmente acompanham esse comportamento. Desse modo, evitam que o macho alfa tome conhecimento do encontro "romântico".
A organização de proteção dos animais "Farm Sanctuary" quer aumentar a compreensão sobre os galináceos
Apelo à compreensão
O comum Gallus gallus domesticus vem do galo-banquiva (Gallus gallus), uma espécie selvagem do Sudeste Asiático. Trata-se do animal doméstico mais numeroso do mundo. Há cerca de 30 bilhões de espécimes vivendo entre os seres humanos, e aproximadamente o dobro dessa cifra é abatido a cada ano.
A maioria das aves para consumo humano é criada em granjas de bateria, e muitas não veem a luz do dia durante toda a sua breve existência. Elas são impedidas de se desenvolver adequadamente, espremidas em pequenas gaiolas e se ferindo mutuamente, como reação ao ambiente estressante.
"A pesquisa existente sobre os galináceos é bastante sugestiva", resumem Marino e Colvin. "Ainda assim, uma compreensão mais abrangente desses fascinantes animais exige muito mais pesquisa respeitosa e não invasiva, em ambientações naturais, que lhes permitam se expressarem e, deste modo, ajudar-nos a aprender mais sobre o que realmente são", afirmam.
"Inspiradas pelo que sabemos atualmente sobre as galinhas, torcemos por um futuro pleno de relacionamentos humano-galináceos, curiosas sobre e celebratórias daquilo que ambas as espécies têm em comum", concluem as pesquisadoras.
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